No mesmo dia em que a Polícia Judiciária levou a cabo 20 buscas em várias localidades no âmbito da operação “Mais Valia”, eis que o seu diretor nacional, Luís Neves, aparece sorridente na cerimónia de posse de Fernando Gomes como presidente do Comité Olímpico de Portugal.
Fernando Gomes, recorde-se, era presidente da FPF na altura dos negócios imobiliários agora sob investigação e embora não tenha sido constituído arguido, o caso ainda não está concluído.
Perante as câmaras, Luís Neves apressa-se a afirmar que Fernando Gomes “não é visado na investigação” e fá-lo com a tranquilidade de quem parece ignorar que:
1. a operação ainda decorre;
2. há material apreendido a ser analisado;
3. novos elementos podem surgir que venham a implicar quem, por agora, não é arguido.
Ainda que se reconheça a Luís Neves algum mérito na gestão da imagem pública da PJ (algo que durante décadas foi negligenciado e que agora, com dolo, se faz), convém lembrar que o verniz apenas esconde a sujidade que existe nas unhas e que nesta ocasião, de forma infantiloide e amadora, Luís Neves borrou a pintura.
Com a sua intervenção pública ao lado de Fernando Gomes, no dia e hora em que as buscas decorriam, colocou-se na incómoda posição de poder ser visto como suspeito de favorecimento pessoal.

Mais do que uma simples infelicidade de comunicação institucional, a declaração do diretor nacional da PJ pode representar uma tentativa de condicionar o curso da própria investigação.
Quando quem dirige a instituição que realiza a investigação já inocentou publicamente um potencial visado que espaço resta para os inspetores (investigadores) e magistrados (Dominus do processo) seguirem os indícios com liberdade e imparcialidade?
Como poderão os investigadores contrariar a autoridade do “Capo di tutti capi”? (sem qualquer intenção de colar a imagem de mafioso ao Sr. Dr. Nacional da P.J., apenas uma liberdade de estilo, uma profunda paixão pela língua italiana e uma notória falta de talento para a boa escrita).
Luís Neves fez-me lembrar um “terrorista judiciário” (como ele próprio qualifica os Advogados) a apresentar aos media uma declaração do seu constituinte, gerindo os danos reputacionais e preparando a sua defesa com base em “inside information” (presumivelmente e conforme a imagem do DN que ilustra este texto).
“Mais Valia”, afinal, parece ser o nome ideal: mais valia termos instituições que respeitem a separação entre investigação e relações pessoais.
“Mais valia” termos dirigentes que compreendem que a confiança pública não se conquista com discursos, mas com Ética.
“Mais valia” termos uma Justiça que investigue sem medo nem favores (presumivelmente, claro).
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João de Sousa é consultor forense na Eppur si – Consultoria, Análise e Formação Forense, Lda. É ex-inspetor da Polícia Judiciária.