Nos últimos anos, as redes sociais transformaram-se num dos palcos mais relevantes para o debate político. Com um número crescente de utilizadores ativos em plataformas como Facebook, Instagram, X (antigo Twitter), TikTok e YouTube, a influência do mundo digital nas eleições autárquicas está a ganhar uma dimensão sem precedentes.
A proximidade das eleições locais em Portugal traz à tona uma questão central: até que ponto as redes sociais podem influenciar as decisões dos eleitores? Embora as eleições autárquicas sejam tradicionalmente mais centradas em dinâmicas locais e em candidatos com forte presença comunitária, o papel crescente das plataformas digitais está a redefinir a forma como se fazem campanhas, como se molda a opinião pública e, potencialmente, como se decide o futuro político dos municípios.
Uma Nova Arena para a Política Local
Ao contrário das campanhas tradicionais — onde o contacto porta a porta, os comícios e os debates presenciais desempenham um papel fundamental — as redes sociais oferecem aos candidatos uma oportunidade única: comunicar diretamente com os eleitores, sem intermediários. Este contacto direto permite uma abordagem mais personalizada e segmentada, adaptando as mensagens aos interesses e às preocupações de diferentes públicos.
Além disso, o baixo custo das campanhas digitais, comparado com a publicidade convencional, permite que candidatos com orçamentos mais limitados consigam alcançar uma audiência vasta. Pequenos partidos e movimentos independentes, que muitas vezes enfrentam dificuldades em se fazer ouvir nos meios tradicionais, têm agora a oportunidade de se destacar e mobilizar eleitores através das redes.
O Efeito Bolha e a Polarização Digital
Contudo, as redes sociais não são isentas de desafios. O efeito bolha, em que os utilizadores são expostos apenas a opiniões semelhantes às suas, pode reforçar a polarização política. Este fenómeno é potenciado por algoritmos que privilegiam conteúdos com os quais o utilizador mais interage, criando uma espécie de “câmara de eco” digital.
No contexto das autárquicas, isso pode levar à radicalização de discursos e dificultar o debate pluralista, uma característica essencial da democracia. A proliferação de fake news e desinformação, por exemplo, pode influenciar indevidamente a perceção pública sobre candidatos ou propostas, afetando diretamente o resultado eleitoral.
O Poder dos Influenciadores e das Campanhas Virais
Outro fenómeno emergente é o papel dos influencers nas campanhas eleitorais. Embora mais associado a campanhas nacionais ou internacionais, o impacto dos criadores de conteúdo local não deve ser subestimado. Um influencer regional com forte presença digital pode mobilizar centenas, senão milhares, de eleitores — especialmente entre os mais jovens, que frequentemente se encontram distantes dos debates políticos tradicionais.
Campanhas virais, com vídeos curtos e mensagens claras, são cada vez mais utilizadas para captar a atenção em segundos — uma estratégia particularmente eficaz em plataformas como TikTok ou Instagram Reels.
Regulação e Ética
Apesar das oportunidades, a crescente digitalização das campanhas autárquicas levanta sérias questões éticas e legais. A transparência no financiamento de campanhas digitais, o uso de dados pessoais para fins eleitorais e a manipulação através de bots ou campanhas de desinformação são preocupações reais.
Embora a União Europeia tenha dado passos importantes com o Digital Services Act (DSA) e o Regulamento Europeu de Inteligência Artificial, Portugal ainda enfrenta desafios na implementação de mecanismos de fiscalização adequados, especialmente no contexto local.
Conclusão
As redes sociais vieram para ficar e já estão a transformar a forma como os portugueses se relacionam com a política local. Embora ofereçam novas oportunidades de envolvimento cívico e democratização do acesso à informação, também trazem riscos significativos de manipulação, desinformação e polarização.
Com as próximas eleições autárquicas no horizonte, será essencial que candidatos, eleitores e reguladores estejam conscientes das armadilhas do mundo digital e trabalhem juntos para garantir que a tecnologia sirva a democracia — e não o contrário.
Álvaro Rocha é Professor Universitário, Consultor e Empresário.